quinta-feira, 4 de junho de 2015

Em Nome do Pai

Crédito da Imagem: Zé  Barbosa

Por Thays Fernanda dos Santos Silva

Relacionamento é um tema um pouco complicado para discussão, vivê-lo é ainda mais difícil, ainda mais quando nossas vidas giram em torno disso: nos relacionamos uns com os outros todos os dias e a forma  dessas relações é que levarão corpos e mentes a convergir, ou não.

Em nome do Pai é um espetáculo que trata da relação entre pai e filho após a morte da mãe, figura bem presente na vida dos dois, cada um com sua particularidade e carga. Durante o desenrolar das cenas, uma disputa entre pai e filho pelo amor da mãe vai sendo revelada, ao mesmo tempo em que discutem sobre o peso da perda e sua presença ainda bem viva em cômodos da casa. Logo na primeira cena, encontram-se pertences da mãe sobre móveis da sala, ambiente esse que permanece até o fim do espetáculo. A foto em preto e branco num porta-retrato sobre um móvel centralizado na cena reforça ainda mais essa presença, aos mesmo tempo em que elementos fúnebres no cenário, como malas acolchoadas como o interior de caixões servindo como cadeiras, reforçam sua ausência.

O filho é ator. Sua sensibilidade, forma de ver o mundo e a impotência diante do pai deixam essa relação ainda mais conflituosa. A perda da mãe e esposa os faz travar uma verdadeira batalha de sentimentos, egos. Durante todo o espetáculo, suas memórias mais íntimas vão sendo reveladas, deixando o clima ainda tenso e confuso para os dois. Não é nada fácil se expor, ainda mais quando se busca a reconstrução de algo que parece nem ter sido construído, ou foi, mas não juntos.

O texto nos causa reflexões sobre a situação, não só das personagens, mas também nossas diante da vida. Questionador e divertido ao mesmo tempo, o texto nos faz passear entre o que é real e o que é cena, aliás, os momentos mais divertidos do espetáculo. Por ser ator, o filho acaba ensaiando com o pai cenas de uma peça que estuda no momento e é justo neles que o cenário se torna mais funcional. 

As cadeiras/malas/caixão recebem outros significados, os caixotes como mesa de centro se transformam em montanhas e tudo o mais que for necessário para nos aproximar do ambiente proposto. Louças que constroem o lustre no centro da cena (lindíssimo por sinal), talheres e coisas de cozinha, casam com a sonoplastia e o ambiente. Tudo remete a casa, ao ambiente de um lar.

A sonoplastia passeia por um som de Saxofone, tilintar de pratos, talheres, louças que arranham e guitarras pesadas. Em alguns momentos perdi certas palavras justo pelo som do Sax, o vizinho músico surgia em algumas cenas e ficou complicado ouvir bem, causou um estranhamento não muito confortável, a princípio. Ainda sobre os sons, em um determinado momento, pensei ter ouvido a voz do pai sair da caixa de som, talvez para reforçar sua superioridade na cena. Ainda assim, penso ter sido dispensável, o texto e o ator estavam dando conta. Aliás, convincente.

Não conhecia nenhum outro trabalho do ator Jorge de Paula, possui presença vocal e física, trouxe mais força para as cenas. Samuel Lira, o filho, teve um bom desempenho, mas acredito que pela idade e também experiência com o teatro, Jorge tenha ficado um pouco exposto. Senti seu corpo um pouco armado, tenso, a espera da ação. Mas foi apenas o segundo dia de espetáculo, tudo ainda há de crescer muito. Samuel é músico e não conhecia seu trabalho como ator. Muito bom vê-lo em cena, surpreendente e corajoso.

O espetáculo foi bem recebido pelo público, houve risos e inquietações. Público esse que questiono. Para quem o espetáculo é dirigido? O Teatro da Livraria Cultura, o Eva Herz, é bonito, confortável, mas complicadíssimo de chegar. O Rio Mar é localizado onde quem não tem veículo próprio, só por muito amor ao teatro mesmo vai. Dois ônibus e um metrô me levaram até lá e o público foi diferente do que costumo ver. Pelos corredores fui uma figura curiosa para os frequentadores do local. Sou defensora da acessibilidade do teatro para todos e deixo meu apelo, na esperança de tornar a vê-lo em outras casas mais populares, ao público mais “comum”.

OBS: Caso haja alguma alguma restrição quanto ao uso da imagem ou seu conteúdo, favor informar imediatamente a rodrigodourado78@gmail.com

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